Estudante negra é alvo de racismo durante torneio escolar em São Paulo

Na última quinta-feira (10), um episódio de racismo ocorreu em um torneio de interclasses no Acre Clube, na Zona Norte de São Paulo. Maria Clara*, uma estudante negra de 14 anos, foi alvo de ofensas racistas proferidas por colegas do 3º ano do Ensino Médio enquanto assistia a uma partida de futsal.

A mãe de Maria Clara, a educadora e vereadora suplente Adriana Vasconcellos, relatou que o ataque começou com gritos dirigidos a toda a turma do 9º ano, mas logo se concentrou na jovem. “Ela e uma amiga estavam acuadas. Quando Maria Clara se defendeu, chamando as agressoras de ‘vagabundas’, começou a receber insultos pesados sobre seu cabelo. Uma das meninas chegou a perguntar: ‘Quantas vezes você já lavou esse cabelo?’, enquanto outra a ofendeu dizendo que seu cabelo era ‘cabelo de Bombril, serve pra limpar panela’. Isso foi o auge; ela não suportou mais”, contou Adriana, emocionada.

Após o ataque, Maria Clara ligou para a mãe em estado de desespero, quase sem conseguir falar. “Ela tem crises de ansiedade, e fiquei aliviada que as amigas estavam lá para apoiá-la”, relatou. Enquanto aguardava a mãe, Maria Clara decidiu sair da quadra para comprar um refrigerante e tentar se acalmar. No entanto, durante o caminho, cruzou com um dos alunos que a havia ofendido, que a provocou novamente, imitando sons de macaco.

Adriana chegou ao clube e ficou chocada ao ver que o jogo ainda acontecia normalmente. Revoltada, questionou os professores e a inspetora sobre por que a competição não havia sido interrompida, uma vez que um crime havia ocorrido. “A escola parecia estar dizendo para ela: ‘deixa pra lá’. Foi um silenciamento inaceitável”, criticou.

Após a insistência de Adriana, os funcionários começaram a dispersar os alunos do Ensino Médio e levaram os responsáveis pelos ataques verbais de volta ao colégio, que fica a menos de dois quilômetros do clube. Enquanto aguardavam, a mãe acionou a Polícia Militar. Quatro viaturas apareceram na escola para prestar apoio.

Três estudantes, acompanhados dos pais, foram levados ao 13º Distrito Policial da Casa Verde. A polícia, porém, não conseguiu localizar todos os envolvidos no episódio. O boletim de ocorrência, ao qual o g1 teve acesso, foi registrado como ato infracional análogo ao crime de injúria racial.

Adriana compartilhou seu desespero ao lidar com a situação. “Eu não desabei a chorar porque tinha que ser forte por ela. Minha vontade era chorar desde a hora que ela me ligou, mas eu tinha que ampará-la”, relatou. A dor não foi apenas pela situação atual, mas também por reviver suas próprias experiências de preconceito. “Como mulher negra, essa dor é muito pessoal. É um sofrimento ancestral que nos toca profundamente”, disse.

O advogado da família, José Luiz Oliveira Júnior, criticou a postura da escola em relação ao ocorrido. “A escola deveria ter se posicionado de forma veemente contra qualquer forma de discriminação”, afirmou. Em resposta, a direção do Colégio São Paulo informou que os alunos foram retirados do local e a partida encerrada. A coordenação da escola convocou os pais para discutir o incidente, mas os alunos negaram as acusações racistas.

A instituição declarou que “repudia toda forma de discriminação e racismo” e que, se as investigações confirmarem os atos racistas, os alunos responsáveis serão expulsos. No entanto, o caso levanta questões importantes sobre como escolas de elite lidam com racismo, homofobia e preconceito, especialmente em relação a alunos bolsistas.

O mestre em História da Educação Léo Bento sugere que as escolas devem implementar, no mínimo, quatro medidas para combater o racismo: letramento racial, criação de uma comissão antirracista, políticas de contratação afirmativa e análise de currículo. “As escolas precisam se preparar com letramento racial para toda a comunidade. É essencial entender como a nossa sociedade se organiza racialmente e como isso impacta as relações sociais”, afirmou.

O episódio com Maria Clara é um lembrete contundente da importância de se trabalhar a diversidade e a inclusão nas escolas, não apenas para proteger os alunos, mas também para educar toda a comunidade escolar sobre respeito e igualdade.

*Nome alterado para preservar a identidade da vítima.

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